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Previsão do Tempo
Por que a previsão não acerta sempre?
Por que a previsão não acerta sempre?

Apresentamos algumas informações técnicas que explicam por que nem sempre conseguimos identificar um evento de chuva.

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Escrito por Fabio Mangia
Atualizado há mais de uma semana

Não há uma resposta simples para essa pergunta e é necessário discutir alguns tópicos antes de qualquer conclusão ser escrita.

Inicialmente é importante ter ideia de como são os sistemas meteorológicos que causam chuva e para isso nós preparamos um artigo sobre tema, basta acessar aqui. Em seguida, é importante saber como funciona a previsão de tempo. Este artigo aborda o tema de forma simples e aqui nós vamos abordar esse tema em mais detalhes, destacando as incertezas presentes nos modelos numéricos atmosféricos.

O que é um modelo numérico atmosférico?

De forma resumida, um modelo atmosférico é um conjunto de equações matemáticas e físicas que representam os diferentes processos atmosféricos. As equações básicas que descrevem o estado da atmosfera são:

Estas são as equações básicas, mas cada processo físico tem um conjunto de equação que o representa, chamado de parametrização. Existem diferentes parametrizações para representar o mesmo processo, cada uma abordando-o de forma diferente, implicando em resultados diferentes dependendo do objetivo da simulação, da área de estudo, etc.

Todavia, tanto as equações básicas como as parametrizações são aproximações do real, logo, possuem um erro associado e são fontes de incertezas.

Como um modelo prevê o tempo?

Para um modelo prever o tempo, ele não desenvolve estas equações com base em nada, ele precisa de condições iniciais para poder começar os cálculos. As condições iniciais são obtidas a partir de dados observados das mais diversas fontes: estações meteorológicas, balões meteorológicos, radares, satélites, etc. De posse de todas essas informações, um modelo global pode iniciar a sua previsão, porém, caso esses dados iniciais possuam algum erro, ele será transmitido para o modelo, o que já gera mais uma fonte de incertezas.

As previsões de um modelo são feitas em cima de uma grade, na qual cada uma das diferentes equações é calculada em um ponto desta grade (Figura 1). Estas informações são integradas gerando um resultado espacial e em diferentes tempos. É importante lembrar que a atmosfera possui 3 dimensões, sendo assim, essa grade também se estende verticalmente, com a mesma quantidade de pontos, mas em várias camadas, gerando uma representação 3D da atmosfera.

Figura 1: Exemplo de um grade na horizontal (esquerda) e na vertical (direita). Fonte: https://orchidas.lsce.ipsl.fr/.

Quando maior for o número de pontos, maior será a resolução horizontal do modelo e quanto maior o número de camadas na vertical, maior será a resolução vertical do modelo.

Aumentar a resolução de um modelo global não é tarefa simples. O poder computacional necessário aumenta consideravelmente, além disso, não são todas as equações que foram projetadas para trabalhar em alta resolução. No entanto, quanto há necessidade, pode-se calcular com uma resolução maior em uma menor região, o que é chamado de modelos regionais. Estes modelos foram especificamente projetados para trabalhar em alta resolução e usam como dado inicial a simulação de modelos globais, logo, as incertezas dos modelos globais também acabam passando para os regionais.

É possível melhorar a previsão?

A medida que a tecnologia e a meteorologia evoluem, os próprios modelos evoluem juntos. As equações estão ficando mais precisas, os dados observados são mais numerosos e com maior qualidade e os modelos são mais consistentes. Tudo isso contribuiu para ganhos significativos na qualidade das previsões de tempo.

Ainda assim, qualquer alteração em qualquer detalhe de um modelo pode ser o suficiente para gerar um resultado completamente diferente do esperado.

Então qual modelo é o melhor? Não há uma resposta definitiva para esta pergunta. Todos os modelos apresentam incertezas e nunca serão 100% fiéis ao observado. No entanto, há maneiras de conseguir um resultado melhor combinando diferentes modelos. Uma destas maneiras é a utilização de uma técnica chamada ensemble. Esta é uma das abordagens utilizadas pela Agrosmart.

Devido aos diferentes resultados obtidos por cada modelo, não é possível ter certeza se o tempo foi previsto corretamente ou não. A ensemble garante, por meio estatístico, a previsão mais provável de ocorrer e, em muitos casos, o mais próximo ao real.

Na prática, como isto funciona? A Figura 2 utiliza previsão de temperatura para exemplificar uma ensemble. Cada modelo (linha azul) parte de uma condição inicial diferente e chega em uma previsão diferente. Com a construção de uma ensemble, a previsão será focada no resultado mais provável de todos os modelos (no pico da parte amarela no eixo vertical da direita).

Figura 2: Diferentes previsões de temperatura (linha azul) a partir de uma condição inicial (eixo vertical da esquerda) gerando diferentes previsões (eixo vertical da direita). Fonte: Grönquist et al (2019)

A seguir, apresentamos um exemplo que mostra a dificuldade de se fazer a previsão do tempo.

Análise de um caso de falha na previsão (14/07/2020)

No dia 14 de Julho de 2020 uma tempestade atingiu o interior do Mato Grosso do Sul. Estações Meteorológicas da Agrosmart registraram mais de 35mm de chuva em menos de 30 min. Neste dia não houve previsão de evento de precipitação. O que aconteceu?

Primeiramente, qual era a condição atmosférica nesse dia? Não havia nenhum sistema de grande escala influenciando nas condições de tempo e em grande parte do Brasil havia tempo bom. Na costa do Atlântico é possível observar uma Frente Fria, porém a sua influência sobre o continente parece ser fraca nesse dia (Figura 3).

Figura 3: Imagem de satélite no canal infravermelho realçado. As cores indicam temperatura do topo das nuvens, quanto mais próximo ao vermelho/rosa, mais frio o topo e espera-se que a tempestade seja mais forte. Fonte: CPTEC.

A presença da frente pode ter colaborado para a formação da tempestade, porém não foi o fator decisivo. A tempestade ocorreu no final do dia, provavelmente devido ao processo de convecção, e de forma isolada, indicando ser um Sistema Convectivo de Mesoescala, um sistema de curta duração (algumas horas, no máximo) e pequena extensão espacial. A Figura 4 mostra o ciclo de vida deste sistema.

Figura 4: Imagem de satélite similar a anterior, para o período das 1700 UTC (14h local) - 2300 UTC (20h local) e recortada para o Mato Grosso do Sul. Fonte: CPTEC.

Este é um caso bastante difícil de ser previsto, pois acontece em uma área pequena e rápido. Se este sistema tivesse 100 km de extensão e duração de alguns dias, um modelo com resolução de 25 km, por exemplo, poderia simular tal sistema, pois vários pontos do modelo estariam dentro da área do sistema e as equação iriam refletir tal fenômeno (Figura 5.a). Neste caso o sistema possui alguns quilômetros de extensão e minutos ou poucas horas de duração, o mesmo modelo não seria capaz de simular o mesmo, pois, no máximo, apenas um ponto estaria dentro da área do sistema (Figura 5.b). Nesse último caso, o modelo estaria “míope” para este sistema.

Figura 5: representação na grade de um modelo de um sistema meteorológico.

Realizando simulações específicas para este caso, testando diferentes configurações do modelo (como variando as características da grade e as parametrizações empregadas), e até a inclusão de dados observados no meio da simulação, talvez este sistema fosse simulado. No entanto, isso seria um estudo de caso e fugiria do padrão de um sistema operacional de previsão de tempo.

Incertezas

A modelagem atmosférica e previsão de tempo evoluíram muito nos últimos anos e continuam a evoluir. As incertezas foram reduzidas significativamente nesse processo, mas ainda existem. É muito importante entender que a previsão de tempo não é uma ciência exata e falhas podem ocorrer.

Nós da Agrosmart estamos trabalhando todo o dia para manter nosso sistema de previsão atualizado com o estado-da-arte da modelagem atmosférica, para garantir a previsão mais precisa para nossos clientes.

Referências:

Grönquist, Peter & Ben-Nun, Tal & Dryden, Nikoli & Düben, Peter & Lavarini, Luca & Li, Shigang & Hoefler, Torsten. (2019). Predicting Weather Uncertainty with Deep Convnets.

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